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sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Novidade, estigma ou desinformação? Farruca

Quem cursa dança flamenca raramente encontrará livros contando a história dos bailes. Aprendemos que os registros históricos se baseiam na evolução do cante que é considerado por muitos a parte mais importante desta arte e onde se tem os primeiros registros do que conhecemos como flamenco. Ainda salvo as fotografias muuuito antigas datadas em torno de 1850.

Depois de tantas transformações nos três pilares básicos do flamenco (cante, guitarra y baile) não é difícil ver de tudo um pouco. Incluo neste pensamento até aqueles palos que não se bailava e que agora entram na categoria performática dos dançarinos mais modernos onde é  visível a teatralidade fusionada com elementos da dança contemporânea. Isso não é de tão ruim. Eu vejo a dança no flamenco como a materialização daquilo que se toca e canta. Então esta novidade é mais que bem-vinda desde que não se distorça a intenção do palo.

Olhando no passado, alguns bailes eram restritos aos gêneros e pouco se via de diferente até que os artistas dos anos 70/80 começaram a dar um novo olhar para eles. Falo de Mario Maya, Antonio Gades, El Güito, El Mimbre, Cristina Hoyos, Merché Esmeralda, Antonio Canales e tantos outros que nos ajudaram a chegar ao que temos hoje na dança flamenca. Eles deram os primeiros passos na "abertura dos portos" para as inovações.

Lembro de uma entrevista de Antonio Gades falando de seu mestre, Vicente Escudero, falando dos gêneros. Algo como "as mulheres possuem suas formas físicas arredondadas e portanto sua dança está carregada de desenhos arredondados, de arabescos desenhados no ar e os homens possuem sua forma física mais angulosa e retilínea como uma espada que corta o ar". Achei isso interessante como forma de entender determinados traços no baile flamenco.

E a Farruca, onde entra nisso? É um baile renascido de antigos cantes galaico-asturianos, segundo dizem alguns historiadores, e que leva as inspirações musicais do tango de Málaga. Mas foi uma forma de baile praticamente masculino trazendo as diretrizes que dizia Vicente Escudero sobre o gênero.

O interessante na dança hoje é  ver como a gama de novas bailaoras ainda visam a Farruca com trajes masculinos como se fosse a única maneira de interpretá-la. Eu vi Cristina Hoyos no Theatro Municipal do Rio de Janeiro fazer sua Farruca num período onde grandes estilistas da moda desenhavam os figurinos das companhias flamencas. Cristina surgia em cena se desenrolando da cortina do teatro com um vestido onde sua saia era composta por duas camadas de tecido pliçado. No início achei um absurdo aquele palo com vestido! Mas percebi que ela não descaracterizou a essência dele e comecei a apreciar. Foi vendo Cristina que meus olhos se abriram para a idéia da roupa na dança flamenca além do estilismo espanholado.

Cristina Hoyos

Quem disse que Farruca tem que ser assim quando uma bailaora a interpreta, de pantalones? Então tive o prazer de ver Imaculada Ortega fazer o mesmo... a Farruca trajada com vestido.


Não sou contra a idéia que toda bailaora faça sua Farruca de calça, mas trago para a reflexão da composição do figurino para a dança flamenca de uma forma geral.

Basta ver La Singla e Carmen Amaya bailando por Alegrías e de calça sem perder a assinatura do baile.

Antônia La Singla

Ou melhor e mais perto de mim! Ver ela sendo cantada e bailada por Renata Chauvière aqui no RJ!


Preconceito ou estigma eu não sei. Mas é  como me apontar o dedo porque bailo com bata de cola ou com o mantón de Manila.

Eu fiz uma Farruca com bata de cola! E aí?


Eu e Carlos Máximo
Farruca

Fica mais uma dica...não pensem a dança flamenca como uma coreografia que leva uma fantasia espanhola. Mas que a roupa compõe e arremata a idéia do seu baile. É  aonde eu questiono o uso da roupa da moda. Nada contra, mas tem que estar afinada com o palo!

Parafraseando a bailaora paulista Ana Mazargão com seu trabalho digníssimo sobre o cante numa coreografia "Vamos escuchá?" digo, "Vamos estudiar" o figurino no flamenco?

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